11 de fevereiro de 2009

AOS IMPERFEITOS

Texto elaborado com finalidade de recepcionar os novos estudantes da UFBA.


Sejam bem vindos a Universidade Federal da Bahia, templo da cultura, dos saberes, da arte e da LUTA. Dou as boas vindas aos imperfeitos, pois estes são os únicos que podem sonhar e criar um estado de transformAÇÃO. Os perfeitos são completos e realizados com sua banguela intelectualidade, sorrindo para a realidade teatral, como se o mundo fosse feito de um simples mudar de canal.

Não, com certeza estes não são vocês que estão neste lugar procurando as perguntas para as respostas que nos ensinaram. Quais são as perguntas? Não pergunte pra mim; você é inteligente. Lê livros, revistas, jornais. Gosta do Almodóvar e sabe o valor de uma boa comédia romântica.

Há pouco tempo, conversando com uma amiga sobre o que deveria escrever para recepcioná-los, ela confessou uma lição. Quando ela ingressou no curso de Psicologia, uma professora falou sobre a falta como um elemento crucial na formação dos alunos da UFBA. Que a falta de recursos, de condições materiais para seguir a graduação, ausência de um qualificado método pedagógico dos professores, entre outras tantas deficiências, têm um papel central na formação ao mostrar aos poucos ao aluno que ali é um lugar de falta...Um lugar onde ele não vai encontrar o que precisa e que por isso ele terá que aprender a buscar por seus próprios meios. Eis o nosso diferencial. Ir além, além do previsível, além do possível.

Tomo a liberdade, diria até audácia de completar dizendo que esses meios se darão através da organização coletiva. O indivíduo possui um importantíssimo papel na construção da história, mas para que seus atos surjam efeitos é preciso um coletivo organizado. Jesus precisou de seus discípulos, Lênin necessitou dos Bolcheviques. Os estudantes necessitam de um coletivo estudantil politizado. E neste momento de inquietações surge o novo incendiando corações e mentes.

Mas de onde surge esta necessidade de se organizar? Esta procura… esta urgência em procurar as perguntas… quando a mais simples das questões permanece sem resposta? Por que estamos aqui? O que é a alma? Por que sonhamos? Talvez estivéssemos melhor se não procurássemos, não sondássemos, não ansiássemos…

Mas tal não é a natureza humana, o coração humano. Não é por isso que aqui estamos. E, no entanto, procuramos dar um contributo, como diz um amigo: salvar o mundo; sonhamos com esperança, sem nunca saber quem iremos encontrar, quem -entre um mar de desconhecidos- nos pegará na mão,… nos tocará o coração… e partilhará conosco a dor da tentativa.

Sonhamos com esperança, sonhamos com mudança, com fogo, com amor, com morte, com o fim da luta silenciosa de classes. Esta nova passagem é o seu sonho se realizando. E a resposta a esta busca, esta necessidade de resolver os mistérios da vida revela-se finalmente. Como a luz incandescente de uma nova alvorada…

Tanta luta por um sentido, um objetivo, para, no final, o encontrarmos nos nossos semelhantes, as experiências do fantástico e do mundano… que partilhamos… A simples necessidade de encontrar um congénere a quem nos ligarmos… e de sentir, lá no fundo,… que não estamos sós.

A universidade é um ritual de passagem, ou deveria ser. Esta passagem de vulgar a extraordinário não se faz de um dia para o outro. Todas as histórias têm um começo. Para os imperfeitos, o pimeiro semestre da sua epopéia começa aqui…

SEJAM BEM VINDOS!

Thiago Fiel dos Santos, um dos militantes de O Estopim! “Incendiando Corações e Mentes”

Dica!

Tai galera pra quem quiser ficar por dentro do que acontece em relação ao aborto:

http://www.youtube. com/watch? v=8fObiDQfdA0&feature=related

http://www.youtube. com/watch? v=XbSUP0G5_ Y0&feature=related


Falemos de aborto
Por
Anna Azevedo

Pela primeira vez no Brasil, o Governo se mostra disposto a estimular o debate sobre a descriminalizaçã o do aborto. O ministro da Saúde, José Rubens Temporão, é abertamente favorável a novas regras que assegurem à mulher o direito de fazer o aborto em hospitais públicos, com segurança. Por ano, 200 brasileiras morrem vítimas de complicações pós-abortos inseguros. Norma recente do Ministério da Saúde obriga todos os hospitais públicos a atenderem mulheres vítimas de complicações de abortos inseguros, tratá-las com dignidade, sem nenhum julgamento moral. Os grupos contra aborto costumam ser radicais e agressivos. No meio desta discussão, chega ano que vem ao mercado o novo documentário da cineasta Thereza Jessouroun (ao lado de Dib Lutfi na foto acima), “O fim do silêncio”. Mulheres mostram seus rostos e falam abertamente sobre como e porque fizeram aborto. O trailer já está no Youtube e as manifestações contra e a favor já pipocam na internet.

O que te levou a fazer um filme sobre este assunto?

Quando o atual ministro da Saúde, José Gomes Temporão, assumiu o cargo, na sua primeira entrevista, declarou que o aborto é uma das principais questões de saúde pública do país. Sua declaração provocou reação imediata e polêmica na sociedade. Pela primeira vez, um ministro da Saúde tinha a coragem de tratar o tema abertamente. Comecei a ler sobre o assunto e achei que este era um tema que valia um documentário. Alguns meses depois, a Fiocruz Vídeo abriu um edital público para a produção de um documentário de 52 minutos cujo tema era saúde pública. Entrei com o projeto e ganhei.
Como o documentário está estruturado formal e conceitualmente?A estrutura do documentário é bem simples: mulheres, de várias idades e profissões, e de três estados do país (Rio de Janeiro, São Paulo e Pernambuco) falam para a câmera, sem esconder rosto nem identidade, como e porque fizeram o aborto. Estas regiões são as que apresentam maior índice de abortos inseguros do país (Sudeste e Nordeste). Uma câmera-car introduz cada mulher, revelando o bairro onde vivem. Alguns inter-títulos pontuam o documentário com as principais informações: números de óbitos que ocorrem, a cada ano, por abortamento inseguro, método mais comum etc.


Por que o filme optou por ouvir apenas as mulheres que praticaram e são favoráveis ao aborto?

Porque acho que o documentário, ao contrário do jornalismo, sempre imparcial, deve apresentar uma posição. Sou a favor da descriminalizaçã o do aborto e mostrei no filme porque. Ao expor as razões de mulheres comuns, como todas nós, por terem feito o aborto, ajudamos a por fim ao tabu que este tema ainda é no Brasil. O documentário é claramente a favor da descriminalizaçã o do aborto. (continua aqui)

Como foi o trabalho de busca pelos personagens?

Divulgamos na internet, em listas de ONGs feministas, listas de partidos políticos e na lista do Terceiro Setor, que estávamos procurando mulheres de todas as idades e destes três estados, que quisessem falar ao filme sobre como e porque fizeram aborto, de preferência há mais de oito anos (prazo em que o “crime” prescreve). Avisamos que não seria pago cachê às entrevistadas. O texto foi repassado de lista em lista com uma rapidez impressionante. A resposta foi surpreendente e tivemos um total de 22 mulheres. Entrevistamos todas que se ofereceram, mas avisamos que haveria uma seleção na edição final. Todas as mulheres entrevistadas disseram que estava mais do que na hora de acabar com este tabu, e que estavam felizes em poder contribuir para a discussão.

Houve alguma dificuldade durante as filmagens por conta do tema?

Todas foram muito corajosas e dispostas. Apenas uma ficou indecisa na hora de gravar porque o pai mora no interior e não sabe que ela fez aborto. Esperei que ela resolvesse, sem nenhuma insistência, mas ela acabou optando por falar, achava importante contribuir. Ofereci ainda a alternativa de, caso ela se arrependesse ao longo do mês seguinte, poderia me telefonar que eu não usaria o depoimento dela. A edição ainda demoraria um pouco. Ela não me telefonou.

O tema aborto no Brasil é polêmico, mas o governo está incentivando um debate nacional. Você tem alguma expectativa de que seu filme seja usado neste processo?

Tenho certeza que o filme vai ajudar neste processo. As cenas que colocamos no youtube, em duas semanas, já tiveram 1.933 exibições (este número pode ser maior, pois não sabemos quantas pessoas assistem a cada exibição) e estão gerando uma discussão impressionante no Orkut, em comunidades que discutem o aborto, e no próprio youtube. A versão de 52 minutos será distribuída em DVD, com extras que não entraram no filme: instituições públicas, fundações, ONGs, OCIPs e universidades poderão solicitar cópias gratuitas ao Vídeo Saúde - Distribuidora da Fiocruz e também estará à venda pelo Selo Fiocruz Vídeo, através do e-mail fiocruzvideo@ fiocruz.br. Acredito que o documentário vai contribuir bastante na discussão do tema no país.

Com o trailer na internet, você já notou algum tipo de reação ao filme?

A reação tem sido extraordinária. Temos recebido dezenas de e-mails de parabéns, de apoio e entusiasmo, mas também muitos radicalmente contra, condenando as mulheres que falaram, me acusando e às mulheres que dão o depoimento, dos maiores absurdos. As mensagens mais agressivas eu não leio. Acho ótima a polêmica, e eles estão discutindo entre si. Vale a pena dar uma olhada na discussão. Os grupos contra aborto costumam reagir de forma violenta contra os que são favoráveis à legalização.

Você teme ter de enfrentar esses grupos?

Já me alertaram bastante sobre isto. Até agora nada aconteceu porque o filme ainda não está totalmente pronto, está sendo visto somente no Youtube. Estamos pensando em exibir uma versão de 72 minutos, que é a mais completa, nos cinemas, para atingir um público diferente. Se isto acontecer, não sei que reações poderia haver.

Você é contra ou a favor do aborto, por que?

Não se trata de ser a favor ou contra o aborto, mas sim de ser a favor ou contra a descriminalizaçã o do aborto. Nenhuma mulher toma a decisão de fazer um aborto de maneira fácil. Sou totalmente a favor da descriminalizaçã o do aborto, pois acho que é um direito da mulher poder decidir se está ou não na hora de ter o filho. Acho que a criminalização do aborto não impede que ele seja feito. Ao contrário, no Brasil ocorrem cerca de um milhão de abortos inseguros por ano, feitos com métodos que põem em risco a vida de mulheres que não podem pagar abortos seguros feitos em clínicas particulares. Elas fazem em curiosas, com sondas, com injeção de líquidos com iodo, com risco de perfuração do útero, ou com dosagens erradas de cytotec (misoprostol) , que provocam abortos incompletos. Têm que recorrer ao SUS para fazer a curetagem e finalizar o abortamento. Muitas delas chegam aos hospitais já com infecção e risco de vida. Os estudos mostram que cerca de 200 mulheres morrem por ano pelas complicações de aborto inseguro. Acredito que filhos devem ser desejados e muitas vezes, por razões totalmente involuntárias, a gravidez acontece em horas não desejadas. Acredito que a descriminalizaçã o deve ser acompanhada de uma séria política de planejamento familiar, pois existe muita falta de informação nas mulheres de baixo poder aquisitivo.


Dica de TAÍS RANGEL
Militante de O ESTOPIM!
DAEnf - UFBA - Coordenação de Comunicação
ENEEnf - Coordenação de Formação em Enfermagem