21 de outubro de 2009

92 anos da Revolução Russa.*

Por Diego Rabelo¹

Na primeira metade do século XX, o planeta foi sacudido por um acontecimento que se reflete até hoje, no século XXI. A mãe Rússia, devastada pela guerra e pela fome, inicia o processo que para muitos só poderia ser construído por um país desenvolvido no centro da Europa.
A queda do Czar em 1905 simboliza o desmoronamento de toda uma forma de relações obsoletas que não mais condiziam com os avanços tecnológicos proporcionados pela revolução industrial dois séculos antes.
Falar sobre a grande revolução Russa de 1917 é, sem dúvida, debruçar-se sobre uma infinita variedade de conjunturas e relações que, de certo, uma simples matéria desatenta do rigor científico e histórico não será capaz de firmar. Aqui, será necessário um recorte panorâmico, porém fiel aos relatos deste grande acontecimento.
Em A Era dos Extremos de Eric Hobsbawm², o historiador tenta definir os acontecimentos da ala oriente do globo da seguinte forma:
... “O mundo que se esfacelou no fim da década de 1980 foi o mundo formado pelo impacto da revolução Russa de 1917. Fomos todos marcados por ela, por exemplo, na medida em que nos habituamos a pensar na moderna economia industrial em termos de opostos binários, “capitalismo” e “socialismo” como alternativas mutuamente excludentes, uma identificada com economias organizadas com base no modelo da URSS, a outra com todo o restante”. ( A era dos extremos, Robesbawm, Página 14)
Mas como é possível compreender um acontecimento improvável naquelas circunstâncias que se desdobraram em costumes, práticas e um contundente sistema político-econômico? Como estudantes de Museologia e cientistas sociais, devemos estar atentos aos contextos manifestados pela conjuntura geral e também a específica no intuito de sermos responsáveis com o critério da pesquisa mesmo que ressaltando uma parte da mesma, ou seja, um recorte. E, respeitando a ferramenta científica fui obrigado a recorrer à fabulosa obra do Jornalista norte-americano Jonh Reed³ que, de certo, ajuda-nos a elucidar um pouco sobre como vivia o povo russo naquela época:
“A filha de um amigo meu chegou um dia à minha casa sufocada de indignação porque uma mulher, condutora de bonde, a havia chamado de camarada”. (REED, Jonh. Os dez dias que abalaram o mundo)

E continua...

A tranqüilidade da “vida normal” era apenas aparente. Do outro lado da cidade, era uma agitação infinita, uma disputa de idéias e de posições políticas. “Durante vários meses”, diz Reed, “em Petrogrado, e em toda a Rússia, cada esquina era uma tribuna pública. Nos trens, nos bondes, em toda parte, repetidamente, surgiam polêmicas e discursos”. (REED, Jonh. Os dez dias que abalaram o mundo)
O gelado país do extremo oriente do globo se aqueceu de idéias e relações que proporcionaram um grande salto qualitativo de ordem intelectual na população. Se no início do século XX a Rússia era apenas um país rude e camponês, quinze anos depois já era uma nação com acesso ao que havia de mais erudito em termo de música e literatura, além de variados círculos e partidos revolucionários.
Relatar a Revolução Russa nos obriga a compreender a intima ligação das massas camponesas e operárias a sua ferramenta, o partido político. A Rússia nos oferece um rico leque de exemplos sobre os partidos e as relações destes com o povo. Seguindo o recorte necessário, um dos mais importantes deles é sem dúvida o Partido Operário Social Democrata Russo (POSDR). Este, na opinião de quem vos escreve, foi responsável pelo mais importante arcabouço teórico dos revolucionários russos no período pré-revolucionário. Em outras palavras, a “mãe” – Não a de Gorki(4), de todo o processo de desenvolvimento e amadurecimento para uma preparação conseqüente e disciplinada na implementação da democracia operária. A estratégia deste partido consistia basicamente em construir a partir das necessidades específicas dos trabalhadores um programa geral para a derrubada da ordem social vigente. Mas a democracia russa ainda era muito nova e carecia de experimentações que instrumentalizassem o conjunto dos trabalhadores.
Neste contexto de buscas e compreensões de estratégias para se adotar a situação, em 1902 há uma grande cisão no POSDR, colocando de um lado os Mencheviques (minoria) e do outro os Bolcheviques (Maioria). Após esta ruptura política nada mais foi o mesmo. Os Mencheviques defendiam de uma forma genérica um governo de coalizão com os partidos da burguesia para a implementação de conquistas democráticas contra o velho regime. Os Bolcheviques acreditavam que a burguesia enfrentava uma grave crise internacional e não seria capaz de garantir até as ultimas conseqüências às conquistas democráticas vividas nos países desenvolvidos da Europa.
Com os desdobramentos do governo de coalizão implementado pela primeira revolução de 1905, os soviets(5) tiveram um fundamental papel na disputa de concepções políticas para a Rússia. Neles e com eles o partido Bolchevique se enraizou na classe trabalhadora operária fazendo avançar o nível de consciência da vanguarda que culminou na grande vitória de outubro de 1917. Dirigidos por Lênin(6), o partido Bochevique resistiu a todas as formas de pressão e agressão, assumindo o controle dos acontecimentos com uma unidade inquebrantável entre camponeses e operários. De certo que os soviets necessitariam de uma dedicação exclusiva deste que vos escreve, mas não me foi possível por espaço e objetivo deste boletim.

O grande interprete da teoria da Práxis, diria em cárcere Gramsci(7) ao se reportar a Lênin, portador de oratória apurada e de profunda habilidade, se destacou como o maior expoente da revolução de outubro além de fundador dos elementos mestres do que viria a ser a URSS. Após a sua morte em 1924 e as seguidas derrotas do movimento operário europeu (Alemanha, Espanha, Itália etc) os sonhos de toda uma nação e geração de revolucionários foram se transformando em pesadelo. A burocracia que o sucedeu, teve Stalin(8) como principal dirigente. Perseguindo, matando e silenciando divergentes, Stalin isolou a URSS afastando-a do seu papel histórico de ajudar na luta dos proletários de todo o mundo contra o sistema da grande propriedade privada dos meios.
Como ponta de lança do império capitalista, Stalin estrangulou todas as possibilidades de vitória do proletariado mundial possibilitando, inclusive, a ascensão de Hitler na Alemanha diante da capitulação da III Internacional frente aos acontecimentos naquele país.
O país dos soviets é e continuará a ser um holofote para o conjunto das gerações da classe trabalhadora em todo o mundo. Ela, mais do que qualquer outra, foi capaz de mostrar aos oprimidos que mesmo com toda a adversidade e dificuldade é possível destruir o agressor como diz o jornal da 19° brigada Eusébio Giambone:
Depois da Revolução francesa, surgiu na Europa uma Revolução Russa, e isso mais uma vez ensinou ao mundo que mesmo o mais forte dos invasores pode ser repelido, assim que o destino da pátria é realmente confiado ao povo, aos humildes, aos proletários, à gente trabalhadora. (Do jornal Mural da 19° brigada Eusébio Giambone, dos Partisans italianos, 1944 – Pavone, 1991, P.406.)
Alguns nos chamam de utópicos, outros – sem tanta propriedade, preferem o senso comum e pueril através de palavras que, na sua compreensão deveriam soar negativas, do tipo radicais. A estes pobres de espírito opto, de certo, por uma reclusão de pensamentos a espera de que, como na Rússia, a conjuntura nos aponte para um amadurecimento veloz feito um motor Ferrari. Em sendo assim prefiro ser chamado de “gripados da guerra fria” ou “pobres meninos ingênuos idealistas”. Estes adjetivos me soam mais carinhosos. (risos)

Honra aos que tombaram glória a revolução!

Criticas, sugestões, manifestações ou desabafos: diego_rabello@yahoo.com.br

*Extraído originalmente do Informe Museológico, boletim informativo dos estudantes de museologia da UFBA. Outubro de 2008.
1- Diego Rabelo é estudante da UFBa, diretor de política estudantil do DAMUSEO-UFBa, além de coordenador de Articulação Nacional da ExNEMus.
2- Historiador Marxista nascido no Egito. Autor de diversas obras das quais se destacam: Trabalhadores e Bandidos e História Social do Jazz, Nações e Nacionalismos e A Invenção da Tradição etc.
3- Jornalista norte americano que escreve com riqueza detalhes a grande Revolução Russa de 1917. Além de “os Dez dias que abalaram o mundo” escreve anteriormente “México Rebelde” dentre outras obras.

4- Artista surrealista russo. Politicamente identificado com os Mencheviques através da sua ala internacionalista. Tem como principais obras: A Mãe, Os degenerados, Os bárbaros etc.

5- Conselhos populares formados por soldados, camponeses e operários. Sem dúvida a forma de autogestão mais vitoriosa de que se tem conhecimento. Assim como na Rússia, chegou a ser implementada nos países que passaram por processos revolucionários como Espanha e França.

6- Maior dirigente do partido bolchevique. Morre em 1924 após, aparentemente, passar por um processo de recuperação vitima de um derrame. Os arquivos da antiga URSS podem revelar muito ainda sobre este acontecimento.

7- Revolucionário Italiano foi preso no regime fascista de Mussolini. Dono de um vasto arcabouço teórico que debate Filosofia, Religião, Política, Cultura dentre outros. A sua principal e inacabada obra chama-se Cadernos do Cárcere e conta com sete volumes.

8- Após a morte de Lênin dirige o partido onde expulsa, persegue, bane e assassina todos os seus opositores. Destrói e isola politicamente a URSS afastando-a do seu papel histórico. Morre em 5 de março de 1953.

Indicações para Leitura:

Os dez dias que abalaram o Mundo (Jonh Reed)
Obras escolhidas (Lênin)
Como fizemos à revolução (Leon Trotsky)
A era dos extremos (Eric Hobsbawm)

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