Movimento judeu criado na década de 1930, em Jerusalém, e
hoje espalhado no mundo inteiro, contraria visão religiosa que teria
determinado criação do Estado de Israel
Por Lilian Milena, Do Brasilianas.org
Fonte:Nkusa
Em 1947, durante uma reunião realizada na Organização das
Nações Unidas (ONU) para discutir a criação de um plano de partilha da
Palestina entre judeus e árabes, o rabino Yosef Tzvi Dushinsku declarou a toda
assembleia que o sionismo - movimento político ideológico criado no início do
século passado que defende a existência de um Estado judaico - não representava
os seguidores do judaísmo, portanto não concordavam com a criação de um
Estado-nação para si.
Dushinsku, judeu de origem húngara, vivia na Palestina com
sua família desde 1930 e foi considerado um dos mais proeminentes rabinos
ortodoxos da região. Ele veio a falecer logo após a fundação do Estado de
Israel, que ocorreu em 14 de maio de 1948.
Desde a segunda semana de novembro os conflitos entre Israel
e Palestina se intensificaram após um ataque surpresa do exército israelense
que culminou na morte de Ezzedin al Qasam, um dos líderes militares do Hamas,
partido que governa a Faixa de Gaza, um dos poucos territórios que sobraram
para os palestinos, desde a criação do Estado de Israel.
Segundo informações da ONU, até a última quinta-feira (21),
a ofensiva aérea de Israel contra a Faixa de Gaza tinha sido responsável pela
morte de 140 pessoas, além de 950 feridos, na maioria civis. Já o número de
mortes no lado israelense, atacado por foguetes lançados contra os judeus,
somava 13.
A ação do governo de Israel resultou em diversos protestos
de judeus, de dentro do próprio país, contrários à ofensiva militar do Estado.
Entretanto, chama a atenção da comunidade internacional o número de fotos e vídeos
compartilhados nas redes sociais de judeus ortodoxos defendendo o fim do Estado
de Israel. O vídeo mais famoso mostra o depoimento do jovem Dovid Weiss membro
do grupo Neturei Karta (do aramaico "guardiões da cidade"), criado em
1937, a partir de um racha do grupo Agudas Yisroel, fundado em 1912, com o
objetivo de combater o sionismo.
No vídeo Weiss cita frases impensáveis para quem sempre
acreditou que o conflito histórico entre judeus e palestinos tivesse bases
religiosas.
“Todos os rabinos que viveram no velho Estado de Jerusalém,
antes de 1948, podem lhes dizer como viviam e coexistiam pacificamente com seus
vizinhos árabes, como tomavam conta das crianças, uns dos outros, durante o
Yann Kippur [mês considerado sagrado no calendário judeu]”.
Weiss denuncia também que judeus ortodoxos antissionistas
que vivem em Israel sofrem constantemente repreensões ou espancamentos. Eles
são chamados por judeus favoráveis a constituição do Estado na Palestina de
“antissemitas”. Semita é um termo que, usualmente, refere-se aos judeus, apesar
de designar os povos originários de uma mesma língua na região do Oriente
Médio, e isso inclui hebreus (judeus) e árabes.
Policial judeu agride manifestante na fronteira com a Faixa de Gaza
A organização Neturei Karta mantem um site (http://www.nkusa.org)
onde tenta desmontar a imagem que o mundo tem da criação de Israel como Estado.
Segundo a organização, a religião judaica vem sendo deturpada pelo sionismo.
Numa carta entregue aos Palestinos da Faixa de Gaza, em julho de 2009, escrita
pelo braço norte-americano do movimento, eles lamentam a existência do
Estado de Israel.
“Os judeus verdadeiros são contra a desapropriação dos
árabes de suas terras e casas. De acordo com a Torá [livro sagrado na religião
judaica], a terra deve ser devolvida a vocês [Palestinos]”.
Essa linha religiosa dos Neturei Karta, que diz seguir
rigorosamente os ensinamentos do judaísmo, aponta que hoje os judeus não tem
direito de ocupar em massa a “Terra Santa”, localizada na Palestina. Isso
decorre de uma crença religiosa que os impedem de ter domínio sobre qualquer
território, mas que os orientam a viver pacificamente nos países onde tiverem
que viver. A criação do Estado de Israel, descrita nos livros sagrados, na
verdade, é retratada como um evento divino, e não tem nada a ver com o mundo
material, de um Estado criado através das mãos humanas.
“[Os sionistas] têm usado a Torá para legitimar seu roubo,
alegando que eles têm direito à terra, mandando para fora os palestinos,
enquanto, na verdade, a Torá proíbe explicitamente isso. Ainda mais audazes
alegam que [a Palestina] era uma terra sem povo para um povo sem terra.
Deveriam parar de dizer isso, porque naqueles dias não existia a cobertura suficiente
dos meios de comunicação imparciais, e contavam com o apoio das potências
ocidentais”, destacam na carta aberta aos palestinos da Faixa de Gaza.
Segundo Weiss, o Estado de Israel cria inimigos, como o
presidente do Irã, Mahmud Ahmadinejad, para justificar ataques e a criação de
exércitos para proteger os judeus em Israel. “Mas nós não queremos inimigos.
Sempre vivemos em paz com os muçulmanos”, completou.
Em setembro, uma delegação de rabinos anti-sionistas
reuniu-se com o presidente do Irã, Mahmud Ahmadinejad, durante sua visita a
Nova York.
Os judeus ortodoxos defendem o desaparecimento pacífico do
Estado de Israel. No vídeo, Weiss pede desculpas aos muçulmanos e afirma que o
único modo de repararem o dano de décadas de violência dos sionistas contra os
árabes é a partir da criação de um Estado palestino. “Depois disso, haverá a
paz e esses 50 anos não passarão de um pesadelo, uma miragem que nada tem a ver
com a verdade”.
O movimento Neturei Karta é acusado de ser uma pequena seita
extremista e ultra-ortodoxa pelos judeus sionistas, mas eles rebatem dizendo
que são milhares espalhados em várias partes do mundo. Aliás, teriam sido
dispersados justamente por lutarem pela libertação da Palestina. Só no bairro
do Brooklyn, em Nova York, existem três sinagogas ligadas ao Neturei Karta.
Joven judeu ortodoxo carrega bandeira do Estado Palestino
18 de Novembro, grupo liderado pelo movimento Neturei Karta
faz protestos em Nova York
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