22 de fevereiro de 2017

Receitas de crise




* Diego Rabelo

A quebra dos títulos hipotecários nos EUA a partir de 2008 colocou mais uma vez em cheque a administração do sistema financeiro americano feito pelos mesmos donos das bancas de Wall Street. Quando as principais revistas especializadas em economia dispararam na direção de que essa era a pior crise do capitalismo moderno, elas não estavam, nem de longe, brincando de vender tabloides sensacionalistas.

O sistema sabe que para a sua existência é necessário expandir os negócios e qualquer ausência de movimento ou processo de estagnação produziria o colapso da roda das moedas. Mas para produzir dinheiro e novas formas de garantir os lucros dos grupos econômicos que dirigem a banca é necessário apostar em negócios quase sempre arriscados.

Para tentar explicar a quebra do subprime e como se deu a pior crise do capitalismo moderno é necessário entender alguns dos elementos subjetivos do americano médio e seu modo de conduzir a vida. Assim, no final da década de 70, um operador comum, até então anônimo da bolsa de valores, chamado Lewis Ranieri, inventou aquilo que pode ser considerada uma das principais sacadas do capitalismo contemporâneo dos últimos tempos: a securitização.

Pautado na observação do comportamento de um cidadão qualquer, Lewis percebeu que os empréstimos passaram a ser baseados em títulos de hipotecas, ou seja, o suporte para os empréstimos bancários se davam através de um valor incontornável para qualquer chefe de família. Afinal de contas, quem deixaria de pagar as prestações das suas próprias casas? Isso tornaria os empréstimos bancários extremamente seguros e rentáveis para a banca de emprestadores, e os que recebiam os empréstimos felizes para continuar a se endividarem. Pois bem, foi justamente essa virada que transformou os contratos de financiamentos dos imóveis em títulos negociáveis e passou a se chamar de "securitização da dívida mobiliária".

Tudo muito certo. Os bancos continuavam a fazer empréstimos e acumular esses títulos durante pelo menos alguns anos e em escala exponencial. Se o proprietário do imóvel não conseguisse quitar a sua primeira negociação hipotecária, facilmente faria uma segunda, terceira ou quarta negociação até tornar a dívida insolvente. O problema é quando milhões de hipotecas tornam-se impagáveis e o sistema bancário tem parte significativa dos seus ativos aplicados nesses títulos.

O resultado dessa marolinha é um verdadeiro tsunami no coração do sistema financeiro global e, automaticamente, em todos os mercados que estão conectados a essa rede, ou seja, o mundo inteiro. É claro que para pagar as contas da usura do sistema financeiro americano o contribuinte estadunidense comum foi chamado a socializar essa tremenda crise. Os defensores do livre mercado tem ojeriza as intervenções estatais, exceto na hora de solucionar as suas aventuras.

Warren Buffet, megainvestidor da bolsa de Wall Street, chamou essa movimentação financeira, que produziu os títulos hipotecários em garantias para empréstimos bancários, de "armas financeiras de destruição em massa". Salvo uma ou outra exceção, os banqueiros americanos não foram responsabilizados pela construção da bolha, afinal de contas, coloca-los na cadeia poderia colapsar todo o sistema.

Já os liberais, que amaldiçoam a presença do Estado na Economia, foram passar o chapéu no tesouro americano e implorar para resolverem as suas dívidas.

É... liberalismo no dos outros é mesmo refresco.

* é militante do Coletivo 4 de Novembro
 

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