Mais de 3 mil estudantes caminharam por mais de três horas e exigiram alternativas para a segurança na universidade
Indo na contramão do “mau humor” com que a reitoria da USP e o Estado vem tratando os últimos acontecimentos na universidade, mais de três mil estudantes realizaram, nesta quinta-feira (9), um ato público irreverente no centro de São Paulo. A passeata ocorre após ação truculenta da PM na Cidade Universitária.
Munidos com cartazes, bandeiras e palavras de ordem, os estudantes percorreram, por mais de três horas, as principais vias do centro antigo com os alunos detidos na reintegração de posse de mãos dadas na linha de frente, dando a impressão de um verdadeiro escudo. A Polícia Militar não acompanhou a maior parte do protesto e houve até intervenção urbana de um grupo de artes cênicas relembrando as atrocidades da ditadura militar.
A manifestação começou e terminou no Largo São Francisco, em frente à Faculdade de Direito. Para o diretor da UNE e do DCE da USP, Thiago Aguiar, o propósito era deslocar o diálogo que acontece dentro da universidade e compartilhá-lo com toda a sociedade. “Estamos aqui contra a ação da polícia e para chamar a atenção da população para a falta de debate que existe entre a direção da USP e a sua comunidade. Se a reitoria fosse realmente aberta, eles teriam resolvido no diálogo a questão da ocupação”, declarou.
Entre maracatus, flautas e violões, ouvia-se: “João Grandino, a culpa é sua. A aula agora é na rua”; “Não à repressão, fora PM”; “Ah, mas que vergonha, acham que a greve é por causa da maconha”. Essas foram algumas das palavras de protestos que os estudantes cantavam durante a caminhada. Essas últimas, inclusive, deram o tom para um grande debate acerca da relação entre a descriminalização da maconha e a ocupação da reitoria.
Dezenas de cartazes denunciavam a mudança de foco da cobertura da imprensa sobre o episódio que começou com a detenção de três jovens no campus. “Não estamos aqui pelo livre consumo de maconha. Absolutamente. Somos contra a opressão da polícia militar dentro do campus”, afirmou uma estudante durante fala no carro de som.
Inclusive, para Henrique Carneiro, professor do Departamento de História da USP e membro do Conselho Editorial da Revista Outubro, a tentativa de prisão de três estudantes pela PM na FFLCH e a reação dos seus colegas em sua defesa são episódios reveladores das muitas contradições que existem na sociedade. “A PM no Brasil é um entulho autoritário do período da ditadura militar. O que devemos extrair disso tudo é o despertar surpreendente da nossa juventude. Mais do que a repressão, temos que exaltar a retomada da participação juvenil”, avaliou.
Na última terça-feira (8), a desocupação do prédio da administração ocorreu de forma violenta, com mais de 30 homens da cavalaria e mais de 400 na Tropa de Choque. Os alunos protestam pela saída da Polícia Militar do campus, o fim do convênio da USP com a Secretaria de Segurança Pública, a liberdade aos presos (sem punições administrativas ou criminais), a retirada de todos os processos “movidos contra estudantes por motivos políticos” e a saída do reitor João Grandino Rodas.
Até o momento de encerramento dessa reportagem, a assembleia geral, que estava programada para começar às 18h, ainda não tinha terminado.
O que não foi destacado
Segundo o estudante de Letras Rafael Alves, há uma série de ações que não foram registradas pela mídia em relação aos últimos acontecimentos. Ele estava do lado de fora da reitoria no momento da reintegração, mas foi deslocado para dentro por um policial e encaminhado para a delegacia.
“Tudo foi implantado, assim como o mobiliário quebrado, para nos incriminar. Os nossos danos foram mínimos”, afirmou o estudante, que ainda destacou outro ponto relevante: “Nenhum PM estava identificado. Todos nos criticaram por termos coberto nossos rostos, mas para mim, nada diferencia um gesto do outro”.
Para Rafael Alves, a militarização da USP com 400 homens do choque – uma força desproporcional diante do número de estudantes que estavam ocupando a reitoria – foi um violento ataque ao direito de lutar, “que expressa para toda sociedade que as liberdades democráticas têm sido tratadas como caso de polícia na USP”.
Em nota publicada pelos 73 presos na reitoria, os estudantes ainda afirmam que a luta não é de uma minoria, como vem sendo retratado. Eles querem uma educação pública como um direito de toda população e uma universidade aberta para todos.
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