17 de fevereiro de 2019

Manifesto: Incendiar o Velho Para Construir a Boa-Nova




"Não será a tristeza do deserto presente que nos roube as perspectivas dum futuro melhor."
Antonieta de Barros




QUEM SOMOS

O Estopim! na Plenária Final do 66º Conselho de Entidades de Base da UNE (CONEB).
Fotografia: Dêja Chagas

Nós, d’O Estopim!, nos caracterizamos enquanto coletivo que se organiza nas fileiras dos movimentos de juventudes desde 1º de Maio de 2008. Nascemos no seio da Universidade Federal da Bahia, entre o mais vulneráveis socioeconomicamente e à partir de uma contradição latente do movimento estudantil organizado. Naquele momento, os coletivos que estavam à frente do M.E da UFBA se posicionavam contra a implementação das cotas raciais e do REUNI (Reestruturação e Expansão das Universidades Federais), enquanto nós já expressávamos a importância da efetivação dessas políticas de ações afirmativas como importante iniciativa para a popularização da universidade, embora soubéssemos que esse era só o início de um processo de expansão e democratização do acesso para quem antes, como muitos de nós, nunca tiveram na história de suas famílias  acesso à educação superior pública e de qualidade. Partimos do movimento de casas de estudantes, atuação coletiva que posteriormente em 2009, desaguou na refundação da Associação de Casas de Estudantes da Bahia (ACEB), instrumento esse que é muito importante para aquelas e aqueles que lutam por moradia digna para que a possibilidade do acesso ao ensino superior seja, de fato, concreta.
O movimento de casas de estudantes formou boa parte de nossos melhores quadros políticos. Vale relembrar aqui a memória do nosso querido Frederico Perez, fundador desse coletivo e aguerrido militante do Diretório Acadêmico de Enfermagem, que hoje carrega seu nome. Nesse mês de janeiro que passou completamos 7 anos sem Fred, militante que foi e ainda é inspiração diária, exemplo de atuação para O Estopim! e para o movimento estudantil baiano. As vitórias do movimento estudantil da Bahia, nos últimos anos, se confundem com a história do nosso coletivo. Para além da atuação no movimento de casas de estudantes, somos parte de conquistas concretas para a vida do corpo estudantil da UFBA, como por exemplo: os restaurantes universitários, os buzufbas, a última residência universitária construída (UFBA R5 - Residência Universitária Estudante Frederico Perez Rodrigues Lima) que carrega, inclusive, o nome do nosso camarada. 
. A luta pelos direitos humanos é, desde sempre, prioridade coletiva para O Estopim!, assim como a luta pela expansão do ensino superior e  pela vida digna das e dos estudantes nas Universidades; não só pela garantia do acesso mas, fundamentalmente, pela permanência desses estudantes que historicamente tiveram o direito à educação negado pelo Estado. Fomos, ainda, impulsionadores para que existisse uma Diretoria de Direitos Humanos, tanto no Diretório Central das e dos Estudantes (DCE UFBA), quanto na União dos Estudantes da Bahia (UEB) e na União Nacional dos Estudantes (UNE). Fomos parte do processo de criação do Memorial do Movimento Estudantil da UFBA, pauta histórica na luta do M.E. Mais recentemente, obtivemos uma grande vitória ao pensar, junto a estudantes, professores e técnicos, um modelo ideal para o Observatório de Direitos Humanos da Universidade Federal da Bahia, projeto que foi prontamente acolhido pela Reitoria e previsto para que sua implementação se inicie o mais rápido possível. 
Acompanhamos os trabalhos da Comissão da Verdade na UFBA, tanto no estado quanto nacionalmente, na tentativa de aprofundar a luta pelo direito à memória. Fomos responsáveis, aqui no estado, por impulsionar a luta pela Memória, Verdade e Justiça para João Leonardo da Silva Rocha, morto em 1975 pela ditadura civil-militar, em Palmas de Monte Alto, cidade do interior da Bahia em que sempre tivemos atuação. A  luta por justiça para João Leonardo resultou em um passo importante para o reconhecimento da verdadeira história da morte do advogado e militante, à partir da exumação de seu corpo para fins de investigação pela Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP), no dia 28 de Agosto de 2017. 
Nós sempre estivemos nas trincheiras junto com aquelas e aqueles que lutam por Memória, Verdade e Justiça, atuando conjuntamente com lutadoras e lutadores que acreditam na construção do socialismo tendo a cultura, a comunicação e a arte como instrumentos de transformação social. A luta por justiça para João Leonardo e o trabalho sobre sua memória possibilitou a criação de um espaço físico onde pudéssemos sonhar e lutar juntos, onde pudéssemos incendiar corações e mentes por um mundo melhor: o Centro Político e Cultural João Leonardo. Mantivemos o ponto de cultura vivo, em Salvador, por mais de 2 anos. Respirando luta, cultura, arte, educação, debate político e sendo um ponto de referência da esquerda baiana enquanto existiu. Construímos com responsabilidade o FUBA (Festival Universitário Baiano de Arte e Cultura - Pré-bienal da UNE) e o XXI ENEARTE 2017, que ocorreu em Salvador, por compreendermos a importância desses espaços para o fortalecimento da resistência estudantil.
 O Estopim! não se comporta, portanto, enquanto juventude de uma corrente de partido político, nem tem discutido em suas instâncias a possibilidade de se tornar uma organização resumida à disputa partidária, pois nós somos um coletivo de juventude que atua no movimento social. No entanto, compreendemos a necessidade de apontar ao conjunto das juventudes organizadas no movimento social uma via para a disputa institucional. Compreendemos também que a construção da Revolução Socialista no Brasil e no mundo se dará por diversas vias, sendo legítimo que nem toda(o) militante do coletivo faça a opção pela construção partidária. Entretanto, é fundamental que, para ser militante da nossa organização, cada pessoa faça uma escolha fundamental: a escolha em dedicar tempo, vida e compromisso com a construção do Socialismo. E é com esse sentimento que nós construímos, com abnegação, há quase 11 anos, o Coletivo O Estopim!

HISTÓRICO DAS RELAÇÕES COM OUTRAS JUVENTUDES QUE SE REFERENCIAM NA APS


Ilustração: Norton Cardoso

A aproximação política entre os coletivos de juventudes com referência na Ação Popular e Socialista tem seu marco histórico a partir da construção d’O Estopim!, durante o 55º Congresso da UNE, em 2017. Nesse espaço, a juventude da APS encontrava-se totalmente desarticulada e ausente da atuação real no movimento estudantil, mesmo tendo uma diretoria da entidade na gestão 2015-2017. Diante do cenário nítido de desorganização, ainda recolhendo o que restou da falecida JSOL (instrumento pelo qual a APS organizou sua juventude até 2016/17), a juventude da APS (JuvAPS) não tinha se organizado para disputar aquele congresso da UNE. No entanto, o coletivo Veias Abertas, que atuava em Minas Gerais (PUC/MG), tinha delegados tirados no estado de MG mesmo sem orientação nenhuma da direção de juventude da corrente. Eis que, então, como um gesto de vontade/necessidade de construção conjunta e ação coletiva, a JuVAPS - naquele espaço representada pelo coletivo Veias Abertas - assinou a tese Refazendo a UNE e votou na plenária final do CONUNE com O Estopim!.

Logo após o congresso da UNE, a coordenação d’O Estopim! foi convidada para um acampamento da juventude da APS, no interior de São Paulo. Foi lá que nasceu a Manifesta, em julho de 2017, partindo de uma demanda do estado de São Paulo por uma identidade visual nova onde pudessem organizar a juventude localmente. Desde então, as direções dos 3 coletivos: O Estopim!, Veias Abertas e Manifesta, aprofundaram o debate sobre a necessidade de uma nova ferramenta nacional de organização das juventudes, que fosse capaz de dar respostas à conjuntura de crises, instalada hoje no seio da juventude brasileira - um dos setores mais atingidos pelos retrocessos de direitos nos últimos períodos. 

Ainda em 2017, de 8 a 10 de setembro, o Coletivo O Estopim! realizou seu acampamento, em Salvador, para o qual convidou representações dos respectivos coletivos já citados. Debatemos entre nós a necessidade da unidade que a atual conjuntura nos impõe. Debatemos marcos, fizemos apontamentos e seguimos na síntese da necessidade de se qualificar o programa político, construindo o debate da unidade entre as juventudes. No dia 22 de dezembro de 2017, o Coletivo O Estopim! enviou à direção da Juventude da APS, bem como para as direções do Veias Abertas e da Manifesta, um documento sobre a nossa relação. Nele explanamos sobre a importância da materialização de um processo de nacionalização das juventudes, pela base e consequente. Esse documento foi fruto dos últimos meses de diálogo, tanto entre as direções dos coletivos, quanto com a nossa base no estado da Bahia.

(...) Após o processo de debate interno sobre a construção de uma juventude nacional que pudesse dar conta de cumprir uma função central na reorganização da esquerda brasileira, apontando um programa construído na base, de massas, popular e socialista, apostamos no diálogo com outros setores da juventude que também enxergávamos trilhando esse caminho. Eis que, no meio desse caminho, as nossas organizações se encontram. Num primeiro momento, JSOL e O Estopim!, e, num segundo momento, Manifesta, Veias Abertas, e outros agrupamentos estaduais e regionais de juventude organizada com referência na APS e no PSOL. A partir de então, em nossa humilde leitura, existe o esforço mútuo para o avanço da construção de uma juventude nacionalizada, organizada no movimento social e também na vida partidária. (...)
Apontamos, nesse documento, a necessidade de que essa construção fosse programática, popular e enraizada na base, pois não acreditamos em uma organização política onde o programa político é pensado pelos iluminados - a famosa cúpula - e imposto à base. Acreditamos que, para dar seguimento ao processo de reorganização da esquerda, precisamos conversar seriamente sobre algumas práticas que já não se aplicam e, sinceramente, nunca deveriam ter sido reproduzidas pela esquerda. Desde o início, nossas intenções estavam expostas e, inclusive, as registramos em documento: 

(...) Da atuação conjunta, construída entre a juventude da APS e O Estopim!, acreditamos que, com passos firmes e diálogo, existe um potencial horizonte de construção em comum fértil e potente. Nos espaços onde tivemos oportunidade de atuação conjunta, para dentro da UNE, movimento feminista, disputa interna do PSOL, acampamentos, e outros espaços de atuação do movimento social, o saldo foi positivo. Constatamos que existe proximidade programática na leitura e na atuação das juventudes. O resultado dessa aproximação rebate, concretamente, na aproximação do 4N e APS. A intenção é que as duas organizações se tornem uma, ao fim desse processo. Entendemos que esse processo não pode se findar sem resultados concretos e saldos qualitativos para a Juventude da APS. Tanto para nossa organização da juventude em nível estadual, na Bahia, bem como para organização nacional da juventude da corrente. (...)
Apontamos a política que gostaríamos de construir e de debater junto aos demais coletivos. Apresentamos caminhos e até mesmo um cronograma, com datas e marcos da nossa construção programática, e, segundo esse, teríamos concluído a unificação (ou pelo menos boa parte dela) ainda no fim de 2018. Apontamos todos esses elementos, por escrito para a direção da corrente, em dezembro de 2017:
(...)Esperamos que a direção da juventude da APS possa ler, debater e contribuir na construção desse documento. A intenção é que se torne um documento conjunto e que possamos elaborar um plano de trabalho para apresentar à direção da corrente. É necessário o convencimento da corrente como um todo sobre a necessidade da prioridade a construção de juventude. Estamos à disposição para contribuir com o convencimento geral, caso necessário.(...) 
Acreditamos que a política é feita de gestos. E nós fizemos muitos. No entanto, sempre deixamos explícita a nossa prática política e os nossos limites, bem como a necessidade de superação de algumas dificuldades, que avaliamos um dos passos essenciais para a construção do futuro da esquerda brasileira. 

Nesse mesmo documento, sobre a relação entre as juventudes, destacamos:

(...) É tarefa da juventude superar a crise geracional que a esquerda vive hoje, como parte da nossa tarefa na reorganização da esquerda. Dentro e fora das nossas organizações, teremos que superar a velha política e métodos falidos (...)
Como resposta ao documento, enviado pela coordenação d’O Estopim! para a JuVAPS, fomos convidados para a uma reunião presencial, em Janeiro de 2018, em Belo Horizonte. Lá, debatemos o método de construção de um programa que pudesse potencializar o que já existia de construção de juventudes e organizar ainda mais pessoas durante esse processo. O método amadurecido pelas juventudes foi a elaboração de uma plataforma colaborativa de juventude onde, a partir dela, seriam construídos espaços estaduais, com debates participativos, para a consolidação de um programa político que unificasse as juventudes em uma só frente. 

O lançamento da plataforma seria durante o Fórum Social Mundial 2018, no dia 14 de março, em Salvador. O seu não lançamento foi marcado pelo crime que chocou o Brasil e o mundo: a execução da então vereadora pelo estado do Rio de Janeiro, Marielle Franco. Assim como toda a esquerda, e, principalmente, nós que militamos nas fileiras do PSOL, saímos totalmente fragilizadas do FSM e daquele mês de março de 2018. No entanto, a nossa vontade e sede pela luta nunca cessou. Pelo contrário, a execução de Marielle nos mostrou, ainda de forma mais evidente, como é materializado, às últimas consequências, o silenciamento nos corpos das mulheres, sobretudo das mulheres negras, faveladas, LBTs e organizadas politicamente. A última consequência do silenciamento para essas mulheres é a morte. Simbólica e física.

Seguimos, em abril de 2018, na tarefa de caminhar - ainda que com diversas dificuldades - para o mesmo horizonte comum, em busca da unificação de um programa. Construímos o EME da UNE, espaço de divergência, mas também de potência e síntese; fortalecemos a Frente Povo Sem Medo em todos os espaços onde sua atuação influenciava; construímos espaços internos da agenda eleitoral do PSOL e deliberamos, coletivamente, por colocar um freio no processo de consolidação da nossa plataforma para nos dedicarmos, integralmente, à campanha de Boulos e Sônia e às nossas campanhas nos estados. Acordamos que, ao fim do processo eleitoral, retomaríamos o debate sobre a unificação e que, durante o processo eleitoral, jogaríamos peso na construção do campo das Juventudes Sem Medo. 
Ilustração: Norton Cardoso


Como é de nossa prática, aqui na Bahia seguimos à risca a deliberação determinada coletivamente e nos empenhamos na construção de um processo eleitoral amplo. Ainda que com dificuldades complexas e boicote no diretório estadual do PSOL Bahia, coordenamos e fomos grande parte da força da campanha de Isadora Salomão aqui no estado. Mulher negra, soteropolitana, militante feminista e popular, ela é uma das maiores expressões públicas de toda a nossa construção junto à Frente Povo Sem Medo da Bahia nos últimos períodos. Isadora foi a mulher mais votada para deputada estadual na história do PSOL Bahia, contribuindo diretamente para o quorum geral que elegeu Hilton Coelho à ALBA, tendo sido diplomada como 2ª suplente do mandato pelo partido. 

Uma campanha vitoriosa, construída pelas mãos das juventudes e das mulheres SEM MEDO, que não tiveram tempo para ter MEDO e botaram o dedo na ferida daqueles que, assim como o atual presidente do nosso país, fazem da política profissão e se beneficiam dos privilégios advindos dos gabinetes, legitimando práticas que se distanciam cada vez mais das lutas reais do povo. Denunciamos o velho e disputamos o futuro no presente, durante o processo eleitoral de 2018. Regamos as sementinhas de Marielle e experienciamos, de perto, uma geração de jovens feministas que estão chegando com toda a firmeza necessária para mudar essa cultura política que nos expulsa, cotidianamente, dos espaços de poder. Saímos fortalecidas, ainda que sem apoio algum da corrente política que, nacionalmente, construíamos naquele momento. 

Em dezembro de 2018, após as eleições, as direções dos três coletivos e da JuvAPS se reuniram, novamente em Minas Gerais, para debater sobre como se afirmaria, na conjuntura pós-eleições, o processo de unificação das juventudes. Chegamos à síntese de que precisaríamos experimentar, agora nas bases, o debate que já vínhamos amadurecendo nas direções, para que, de fato, essa movimentação desse consequência a um programa político concreto que desaguasse em uma nova identidade visual e um instrumento nacionalizado de lutas da juventude. 
Ilustração: Norton Cardoso.
Entendemos o CONEB e o CONUNE como dois marcos temporais importantes na conjuntura para o movimento estudantil no geral e para as juventudes dos coletivos. Sendo o CONEB o maior espaço estudantil após a eleição de Bolsonaro e necessidade de dar respostas à conjuntura, sinalizamos que esse era o espaço ideal para um Seminário Nacional de Organização e Formação de Quadros, onde pudéssemos levar, de forma mais aprofundada, a necessidade da finalização do processo de unificação das juventudes. 

Um espaço que deveria possibilitar a existência dos debates para que, finalmente, chegássemos ao produto final de uma síntese programática pela base e que unificasse, na teoria e na prática, as organizações de juventude, em um processo que se findaria em junho de 2019, no 57º Congresso da UNE. Tal caminho seria guiado por uma tese em movimento ao CONUNE, construída pelos três coletivos da JuvAPS e demais coletivos regionais que sinalizaram interesse, muito possivelmente sendo o nome dessa tese o novo nome para a ferramenta de juventude que pretendíamos consolidar, ao fim desse processo. 

Pois bem, sendo o CONEB/Bienal da UNE realizado em nosso estado, e sendo, dos três coletivos que se referenciavam na APS, aquele que mais tem acúmulo de atuação no movimento estudantil, nós, do Coletivo O Estopim!, estávamos positivamente ansiosos e nos preparamos para que o nosso seminário fosse o mais produtivo e rico em sínteses possível. 

Em Salvador, organizamos alojamento, estrutura para formação política, com localização privilegiada e segurança para toda a bancada dos mais de oito estados que aqui estariam para o nosso seminário. No entanto, o que presenciamos aqui, no seio da nossa atuação e no nosso berço político - a UFBA -, foi a situação mais desrespeitosa possível, frente ao debate que a juventude vinha desenvolvendo há quase dois anos. 

Vivenciamos desde a desqualificação, o desrespeito e acuamento, por parte das nossas direções, até mesmo de tentativa de silenciamento, não só da nossa militância, mas também de militantes de outros estados que se colocaram contrários à prática autoritária da Coordenação Nacional da Ação Popular Socialista. Coordenação essa que - representada por dois interlocutores locais, que nunca acompanharam esse processo da juventude (local e nacionalmente), e outro membro da coordenação nacional, presente nesses dias de Bienal - deliberou por si que o tempo e o lugar para a unificação das juventudes seria ali mesmo - no CONEB, sufocando o debate político das divergências ainda existentes que, conforme acreditávamos, precisavam e tinham condições de serem superadas naquele espaço. 

Nos posicionamos contrários à essa deliberação e tentamos argumentar, sem sucesso, a partir da retomada do processo histórico da construção das juventudes, onde as próprias encaminharam propostas de prazos e métodos, cuja unificação não se encerraria no CONEB, mas sim passaria por ele e pelas sínteses construídas lá. Avaliamos que, sem as sínteses necessárias construídas de nós para nós mesmos, a unificação das juventudes, imposta de cima pra baixo, seria artificial. Como avaliamos que foi.

ESPERANÇAS E PERSPECTIVAS


O Estopim! na Plenária Final do 66º CONEB da UNE.
Fotografia: Dêja Chagas

Nós, do Coletivo O Estopim!, temos a tradição do debate e da construção das sínteses coletivas como caminho de nossas ações. Acreditamos que o diálogo franco deve ser feito com toda a nossa militância orgânica e não só com certos ‘’iluminados’’ que acham que podem falar por todos, todas e todes. Aprendemos com a prática feminista que a escuta é fundamental para que possamos não sufocar as divergências, mas sim superá-las, partindo das nossas experiências individuais e coletivas. 

Uma organização ou qualquer construção política sem escuta está fadada a cometer e reproduzir as mesmas violências sobre corpos que são secularmente silenciados, dentro e fora da política. Ouvimos, por diversas vezes durante esse processo verticalizado, que a nossa obrigação era “resolver”’ em “cúpula” e defender na base. Porém, seguimos dizendo que nós debatemos na base para então defender nos espaços de direção uma política consequente, com legitimidade e participação dos braços de luta que conosco constroem. Acreditamos que o fluxo é o inverso do que nos foi apresentado pela direção nacional da APS, nos últimos dias em Salvador. Eles acreditam em um fluxo vertical e estruturado em uma hierarquia classificatória, estabelecida de cima para baixo. Porém, nós só acreditamos ser possível construir o novo a partir de um fluxo de baixo para cima, sem basismos ou democratismo, mas com responsabilidade política com as bases. Só assim poderemos verdadeiramente construir programas e bases consolidadas numa política, de fato, participativa e coletiva. 

Para nós, d’O Estopim!, a autonomia das juventudes e do movimento social é inegociável, pois não é pauta, é princípio. Não podemos continuar tratando a militância dos movimentos sociais como seres incapazes de pensar e construir um programa político coerente. Não podemos continuar a reproduzir entre nós “a elite que pensa” versus “quem carrega as caixas”. Precisamos unir teoria e prática. Sem isso, não será possível a reorganização de uma esquerda capaz de superar os desafios e construir o processo rumo à Revolução Brasileira. 

Sem o amadurecimento do debate sobre quem é a classe, e sem o entendimento verdadeiro sobre quem são os sujeitos da revolução brasileira, não acreditamos ser possível o nascimento de algo novo. Tudo que se pretende a ser novo, reproduzindo o que há de pior na esquerda, na nossa concepção, já nasce velho. 

Portanto, desejamos nossos sinceros votos de sucesso à Juventude Manifesta, mas manifestamos publicamente que nossos valores e práticas militantes nos distanciaram dessa composição, por compreendermos que não é possível criar o novo reproduzindo velhos métodos de uma disputa fratricida entre nós, onde o debate sobre a política não é o centro, mas sim, algo secundário e subjugado a uma identidade visual já pronta. 

Convocamos a todas, todos e todes que, assim como nós, discordaram da forma e do conteúdo que foi apresentado pela direção da APS durante o último CONEB a seguirem firmes na luta e não se retirarem dela, pois a ausência da nossa prática política faz com que a velha política ainda se coloque como possibilidade, em uma conjuntura onde, necessariamente, o novo precisa surgir e se apresentar como alternativa de projeto de poder para o nosso país e para o mundo. 

Seguiremos na luta, pois dela nunca nos arredamos. Seguiremos Incendiando Corações e Mentes por uma nova prática política onde caiba a divergência, o diferente, com a intenção de que possamos consolidar uma nova ferramenta para que os revolucionários e revolucionárias desse tempo e do futuro ergam uma sociedade socialista, democrática e popular. 


"Não estamos perdidos. Pelo contrário, venceremos se não tivermos desaprendido a aprender."Rosa Luxemburgo



Juventude SEM MEDO de LUTAR, constrói PODER POPULAR!


Socialismo até o FIM: O Estopim!



Coordenação do Coletivo O Estopim!


Salvador, 17 de Fevereiro de 2019.

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