12 de dezembro de 2011

Sentença da OEA sobre Araguaia leva parentes ao Ministério Público


Carta Maior

BRASÍLIA - Às vésperas do fim do prazo para que o Brasil cumpra a primeira parte da sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) que condenou o país por crimes cometidos durante a Guerrilha do Araguaia, familiares das vítimas da ditadura militar recorreram ao Ministério Público Federal na luta contra a impunidade dos responsáveis.

Em reunião nesta sexta-feira (9), entregaram à subprocuradora-geral da República Raquel Dodge representações individuais que apontam crimes cometidos contra 15 mortos e desaparecidos. 

Raquel coordena a 2ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal que, em novembro, instalou grupo de trabalho para analisar a sentença da OEA e o reconhecimento, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), da constitucionalidade da Lei de Anistia, que protege e mantém os culpados no anonimato. 

O gesto dos familiares é uma tentativa de denunciar o que seria falta de empenho do governo para cumprir a sentença da OEA, de 2010, e, também, uma sentença anterior da própria justiça local, de 2007.

 Para as famílias, a criação da Comissão da Verdade não é suficiente para garantir o cumprimento da sentença. “Os documentos entregues são aqueles poucos a que os familiares tiveram acesso, porque, mesmo mais de 40 anos depois do fim da ditadura, os arquivos ainda estão fechados”, disse a diretora do Programa para o Brasil do Centro pela Justiça e Direito Internacional (Cejil) Beatriz Afonso. O Cejil é uma das entidades signatárias da ação que conseguiu a vitória na OEA.

Segundo ela, o prazo para que o país cumpra a primeira parte das determinações da sentença vence na próxima quarta-feira (14), mas as expectativas não são boas, na avaliação de Beatriz. Para ela, o governo tem cumprido a sentença de forma burocrática e dissimulada.

 A publicação do resumo da sentença em um grande jornal de circulação nacional, por exemplo, conforme exigido, foi executada após o prazo e sem conhecimento das famílias, que esperavam comemorar o fato com um grande ato político. “Era a oportunidade que todos aguardavam de mostrar quem eram as verdadeiras vítimas e quem eram os terroristas”, afirmou a advogada.

A expectativa, agora, é em relação ao pagamento das indenizações aos familiares que, conforme a sentença, têm que ocorrer, no máximo, até quarta (14). O governo reconheceu como beneficiários cerca de 60 parentes diretos de vítimas de ditaduras, sendo que 39 permanecem vivos e os demais já faleceram. Neste último caso, a indenização será repassada aos herdeiros. 

Restos mortais

Até 14 de dezembro do ano que vem, o governo deverá executar a segunda e mais difícil parte da sentença: devolver os restos mortos dos mortos e desaparecidos, além de investigar e punir os culpados.

Os trabalhos, até o momento, não têm evoluído de modo satisfatório para os familiares. Segundo Crimeia Almeida, da Comissão dos Familiares dos Mortos e Desaparecidos Políticos, em 2009 e 2010, foram realizadas escavações em 63 locais. Nenhum corpo foi encontrado. Este ano, as escavações se concentraram em cemitérios, mas os corpos encontrados ainda não foram identificados como sendo de guerrilheiros. 

Para ela, é essencial que se obrigue as Forças Armadas a disponibilizar as informações sobre os crimes cometidos pela ditadura, pois, sem isso, os trabalhos serão inócuos e a justiça jamais será feita. “A sentença da Justiça brasileira, publicada em 2007, prevê que o governo devolva os restos mortais dos desaparecidos em 120 dias, aplicando multa diária de R$ 10 mil caso o prazo não seja cumprido. E, até hoje, nada”. 

Maria Amélia de Almeida Teles, que também faz parte da Comissão de Familiares, acrescenta que, dos 160 desaparecidos da ditadura, só quatro restos mortais foram resgatados. Segundo ela, somando-se desaparecidos e os executados, o número de vítimas soma 526 pessoas. 

“Foram muitos os crimes que merecem elucidação e punição. Sabemos que pelo menos sete crianças filhas de guerrilheiros foram seqeestradas e entregues para militares criar. Uma delas tem hoje cerca de 37 anos e merece ter direito ao seu passado”, disse.

A deputada Luiza Erundina (PSB-SP), eleita presidente da Subcomissão da Câmara que irá acompanhar os trabalhos da Comissão da Verdade, criticou a forma como o governo Dilma conduziu a aprovação do órgão pelo Congresso. A subcomissão será instalada na próxima terça-feira (13).

Erundina reclamou de o projeto ter tramitado durante um ano e meio quase sem debates, para depois ser aprovado em regime de urgência, sem a participação social, em especial das famílias das vítimas. “A lei acabou saindo de uma forma bastante restritiva para se fazer Justiça. Vamos acompanhar de perto os trabalhos desta Comissão, de uma forma bastante ativa”, prometeu. 

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